segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Homenagem a Eusébio e um Poema de Ary dos Santos

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Meu Camarada e Amigo

Revejo tudo e redigo 

meu camarada e amigo. 

Meu irmão suando pão 
sem casa mas com razão. 

Revejo e redigo 
meu camarada e amigo 

As canções que trago prenhas 
de ternura pelos outros 
saem das minhas entranhas 
como um rebanho de potros. 

Tudo vai roendo a erva 
daninha que me entrelaça: 
canção não pode ser serva 
homem não pode ser caça 
e a poesia tem de ser 
como um cavalo que passa. 

É por dentro desta selva 
desta raiva   deste grito 
desta toada que vem 
dos pulmões do infinito 
que em todos vejo ninguém 

Revejo tudo e redigo: 
Meu camarada e amigo. 

Sei bem as mós que moendo 
pouco a pouco trituraram 
os ossos que estão doendo 
àqueles que não falaram. 

Calculo até os moinhos 
puxados a ódio e sal 
que a par dos monstros marinhos 
vão movendo Portugal 
— mas um poeta só fala 
por sofrimento total! 

Por isso calo e sobejo 
eu que só tenho o que fiz 
dando tudo mas à toa: 
Amigos no Alentejo 
alguns que estão em Paris 
muitos que são de Lisboa. 

Aonde me não revejo 
é que eu sofro o meu país. 

Ary dos Santos, in 'Resumo'

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