Qual é o significado religioso de Jerusalém?
Pergunta 2 de 8
Jerusalém não é um sítio simples, mas antes uma cidade que tem em si um emaranhado de locais sagrados que ao longo da História têm sido alvo de acesas disputas entre cristãos, judeus e muçulmanos. O colunista David B. Green, do jornal israelita Haaretz, resumiu a questão com algum humor e também eficácia: “No que toca a Jerusalém, mudar uma lâmpada na Igreja do Santo Sepulcro é o tipo de tarefa mundana com o potencial para provocar a explosão de uma nova guerra religiosa”.
Se a maior parte daquela cidade com quase 1 milhão de habitantes pode passar despercebida e apresentar semelhanças com tantas outras na região, o mesmo não pode ser dito sobre o seu ponto mais importante: o Monte do Templo, como é conhecido entre judeus e cristãos; ou Esplanada das Mesquitas, como a designam os muçulmanos. Ali, estão concentrados três locais de alta importância para o judaísmo, cristianismo e islamismo.
No primeiro caso por ali ter sido destruído o Templo de Salomão e também o Segundo Templo, do qual resta apenas o Muro das Lamentações.
No caso do cristianismo, por ali terem ocorrido vários episódios bíblicos, entre eles o julgamento e a crucificação de Jesus Cristo.
Finalmente, é o terceiro local mais sagrado para o islão (depois de Medina e Meca), por se acreditar que foi ali que o Profeta Maomé ascendeu ao paraíso e recebeu o ensinamento do segundo dos cinco pilares do islamismo.
A tensão no Monte do Templo, ou Esplanada das Mesquitas, voltou a subir recentemente, em 2017, após três palestinianos terem matado a tiro dois polícias israelitas junto à mesquita de Al Aqsa. Como consequência, as autoridades israelitas vedaram aquela zona a muçulmanos, instalando detetores de metais nas entradas. Seguiram-se manifestações e confrontos, de onde resultaram três palestinianos mortos em confrontos e também três mortes israelitas, como resultado de esfaqueamentos. A tensão acalmou quando, uma semana depois de ter instalado os detetores de metais e de ter banido a entrada a muçulmanos, Israel voltou atrás nessa decisão.
Ao longo dos anos, toda esta tensão religiosa alargou-se também ao campo da geopolítica. Nesta faceta, há algumas datas chave ao longo do século XX, que exploramos no ponto seguinte.
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in: oglobo.globo.com
De que forma tem a cidade de Jerusalém sido alvo de disputa entre Israel e os seus adversários?
A primeira data a reter é 1918. Foi nesse ano que, com o fim da Primeira Guerra Mundial, o Império Otomano se desintegrou e os seus territórios foram divididos entre as forças vitoriosas, por intermédio da Sociedade das Nações. Nesse processo, a Palestina ficou a cargo do Reino Unido que, enquanto teve aquela posse colonial, fomentou a imigração de judeus para aquele estado. Jerusalém tornou-se um dos sítios mais procurados por esses recém-chegados — o que criou logo de início tensões entre a comunidade palestiniana já instalada e aqueles que ali se estabeleciam. A partir de 1922, Jerusalém é considerada a capital da Palestina.
A segunda data de relevo surge três décadas depois, em 1947. Dois anos depois da Segunda Guerra Mundial e da perseguição nazi aos judeus na Europa, as recém-criadas Nações Unidas acordam a fundação de Israel enquanto estado judaico. O acordo então estabelecido já teve em conta as sensibilidades religiosas em causa na região e, por isso mesmo, designava Jerusalém como um “corpus separatum”. Ou seja, em vez de fazer parte de Israel ou da Palestina, seria antes um território internacional, desmilitarizado e cuja administração cabia às Nações Unidas.
Foi sol de pouca dura. A fundação do estado de Israel foi mal aceite pelos líderes árabes da região que, não aceitando o novo statu quo criado às suas portas, precipitaram o início da guerra israelo-árabe em 1948. Contra Israel, estavam vários países árabes, entre os quais os vizinhos Palestina, Síria, Egito e Jordânia. No decorrer desse conflito, a 5 de dezembro, Israel anexou Jerusalém Ocidental, estabelecendo ali a sua capital uma semana depois — e passados 15 dias já ali funcionava o parlamento, o Knesset. Como resposta, a 13 de dezembro, a Jordânia anexou a metade oriental de Jerusalém, conhecida como Cisjordânia, e estabeleceu ali a sua segunda capital. As duas anexações foram condenadas pelas Nações Unidas, que não foram consultadas para este desfecho. No final da guerra, em 1949 os dois lados acordaram a Linha Verde, que estabeleceu até onde ia o território de Israel e o dos seus vizinhos.
A tensão nunca diminuiu até à próxima data chave. Em 1967, explode a Guerra dos Seis Dias, que resulta numa vitória decisiva para Israel, com vários ganhos territoriais. Entre estes, estiveram a Faixa de Gaza (até então do Egito), os Montes Golã (antigamente da Síria), a Península do Sinai (que era do Egito e foi devolvida nos acordos de paz de Camp David, em 1978) e, mais importante para este caso, a Cisjordânia, que saiu das mãos da Jordânia. Na prática, Israel ultrapassou a Linha Verde e, com a exceção da Península do Sinai, não recuou para trás dela.
Na verdade, apenas avançou. Após a Guerra dos Seis Dias até aos dias de hoje, já sob a liderança de Benjamin Netanyahu, Israel tem procedido a uma política de construção de colonatos nestas regiões, tornando cada vez mais efetiva a sua expansão naquela região. Atualmente, vivem mais de 600 mil pessoas para lá da Linha Verde de 1967, em colonatos israelitas.
Esta expansão não só persiste, como tem sido intensificada por Benjamin Netanyahu, apesar de não ter o beneplácito das Nações Unidas. “Antes de 1967, Israel não chegava a ter 15 quilómetros de largura”, disse Benjamin Netanyahu em 2011, depois de uma reunião com Barack Obama, então líder dos EUA, que na reta final do seu mandato abriu caminho a uma resolução de condenação à expansão de colonatos israelitas depois de se abster no Conselho de Segurança da ONU. “Estas não eram fronteiras de paz, eram fronteiras de guerras repetidas, porque um ataque a Israel era apetecível”, disse em 2011 o primeiro-ministro israelita. “Por isso, não podemos voltar a essas linhas indefensáveis.”
Mas qual é a diferença agora? Os EUA não apoiaram sempre Israel, de qualquer das maneiras?
Os EUA e Israel têm uma relação de grande proximidade — e muitas vezes Jerusalém entra nessa equação. No caso dos presidentes norte-americanos, ir a Jerusalém tornou-se mesmo uma tradição política e diplomática. Desde a presidência de Richard Nixon (1969-1974) que praticamente todos os inquilinos da Casa Branca visitaram Jerusalém. As únicas exceções são Gerard Ford, o vice-Presidente que subiu a número um depois da demissão in extremis de Richard Nixon antes do impeachment; Ronald Reagan e George H. W. Bush, dois republicanos cujos consulados representaram um resfriar da relação de cooperação entre os EUA e Israel. Tirando isso, foram lá todos: Richard Nixon, Jimmy Carter, Bill Clinton, George W. Bush, Barack Obama e, mais recentemente, Donald Trump.
Ora, visitar Jerusalém ou deixar-se fotografar em oração junto ao Muro das Lamentações é uma coisa; reconhecer aquela cidade como capital de Israel, indo contra aquilo que é o consenso internacional, é outra.
Até agora, os vários presidentes dos EUA têm recusado reconhecer Jerusalém como a capital de Israel. Essa postura manteve-se até agora, apesar de em 1995 o Congresso norte-americano — com ambas as câmaras controladas pelos republicanos — ter aprovado o “Jerusalem Embassy Act”, que instava o então Presidente, Bill Clinton, democrata, a transferir a embaixada para Jerusalém.
Porém, desde essa altura, os presidentes que se seguiram têm diferido a implementação daquele decreto, alegando a “defesa dos interesses da segurança nacional dos EUA”.
Agora, Donald Trump diz que decidiu permitir a implementação desse decreto, 22 anos depois. “Os presidentes têm diferido [a aplicação do decreto] sob a crença de que isso poderia pôr em causa o avanço da causa da paz”, disse esta sexta-feira. “Depois de mais de duas décadas de diferimentos, não estamos mais perto de um acordo de paz duradouro (…). Seria insensato assumir que a repetição da mesma fórmula poderia produzir um resultado diferente e melhor.”
Na prática, o que os EUA consumam com este gesto é o fortalecimento da posição de Israel numa hipotética mesa de negociações. Não é certo, porém, que as outras partes estejam dispostas a entrar em negociações numa altura em que, em termos simbólicos, a posição de Israel fica mais forte."
in: observador.pt 06.12.2017 por João de Almeida Dias
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