quarta-feira, 3 de fevereiro de 2021

"Aí é que a porca torce o rabo": uma expressão muito conhecida (já Camões a utilizava...!)

"Está a ver o rabo dos porcos, em forma de saca-rolhas? 

Aí é que a porca torce o rabo

O mesmo é dizer agora é que começam as dificuldades. 

A expressão pode ter nascido de uma técnica usada para dominar o animal pela cauda, mas pouco mais se sabe. 

Camões utiliza-a em Os Chamados disparates da Índia: "Na paz mostram coração; na guerra mostram as costas; porque aqui torce a porca o rabo."

(in "Puxar a brasa à nossa sardinha", de Andreia Vale, Manuscrito, 2015)


Outra explicação:


imagem in http://bau-das-curiosidades.blogspot.com

A origem do termo está em que quando o suínocultor quer conduzir um porco, ou porca, de um lugar para outro que não seja muito distante, a melhor forma de fazê-lo é segurando o animal pelo rabo, pois assim o bicho fica dócil. Mas tem um porém! Quando a porca percebe que tem alguém querendo segurá-la pelo rabo ela torce-o por completo e fica sacudindo as ancas para não permitir. Então, como a tarefa se torna difícil mas tem que ser realizada naquele momento, esta é a hora que a porca torce o rabo.

fonte: A PORCA TORCE O RABO (in 

http://bau-das-curiosidades.blogspot.com)

(in pt.quora.com)

terça-feira, 2 de fevereiro de 2021

A Guerra das Vacinas - A Europa e as Farmacêuticas

in dw.com


Penso que o Governo Português e as autoridades de saúde não prepararam, minimamente, o plano da administração das vacinas à população. 

Basta ver a desorganização total que se tem verificado por todo o país. Quem devia ter prioridade, ainda não está vacinado. Torna-se constrangedor ouvir as notícias em todos os meios de comunicação social e ver as reportagens e os testemunhos sobre tamanha falta de acautelamento em relação à vacinação.

Atrasos na entrega das prometidas vacinas contra a Covid-19 estão a levantar questões sobre os contratos assinados pela Comissão Europeia com várias farmacêuticas. E a verdade é que, a necessidade de inocular as populações europeias, através de uma distribuição igualitária e rápida das vacinas, poderá ter levado a União Europeia a aceitar condições no mínimo controversas. Ainda esta sexta-feira, a AstraZeneca e a Pfizer pareciam correr o risco de enfrentar a ira dos Estados-membros devido aos atrasos no fornecimento das prometidas doses semanais, embora, desde que fornecessem o bolo prometido até finais de março, os seus interesses estivessem acautelados, conforme revelava há dias o jornal italiano La Repubblica.

Depois de muita controvérsia, a Comissão Europeia acabou por publicar o contrato assinado com a AstraZeneca, para justificar a sua posição negocial. Em causa, a justificação dada pela empresa para os atrasos, invocando problemas com a sua produtora, localizada na Bélgica. 

Vários indícios apontavam que a verdadeira causa da falta nas entregas seria o desvio de vacinas, ali fabricadas, para o Reino Unido ou para os Estados Unidos. A Comissão Europeia acusa a farmacêutica de não estar a cumprir a fórmula do melhor esforço razoável (best reasonable effort) a que está obrigada contratualmente.

A farmacêutica anglo-sueca estaria a dar prioridade ao Reino Unido na entrega das vacinas, algo contestado pela Presidente da Comissão Europeia. "O texto é claríssimo", insistia Ursula Von der Leyen.

De alguma forma, um acordo terá sido alcançado. 

Além da Agência Europeia do Medicamento ter dado luz verde à vacina da AstraZeneca, a Comissão Europeia estabeleceu um mecanismo de autorização de exportação de vacinas para a covid-19, quando a Comissão Europeia tinha imposto como condição contratual que todas as vacinas a adquirir fossem produzidas em território europeu (no caso da AstraZeneca e no contrato firmado em 28 de agosto de 2020, ainda o Brexit estava a ser negociado, admitiam-se produtoras em solo britânico) e reservadas aos seus próprios cidadãos.

O comissário europeu para o Comércio, Valdis Dombrovskis, revelou que o mecanismo "abrange as vacinas da Covid-19 adquiridas ao abrigo dos contratos de compra antecipada". 

A razão invocada foi a transparência do processo e as doses suficientes para os cidadãos da União Europeia, que a Comissão Europeia já tinha anteriormente dado como garantidas. Entretanto, as farmacêuticas que queiram exportar, para fora da UE, as suas doses de vacinas da Covid-19, terão de pedir a respetiva autorização, já a partir de sábado.

A Comissão Europeia acredita que fica desta forma acautelada a garantia de que as vacinas produzidas irão beneficiar primeiro os seus cidadãos. Bruxelas afirmou pretender inocular o máximo possível de cidadãos europeus até finais de março e a continuação dos atrasos no fornecimento das vacinas ameaçava estes planos. 

Afinal quanto custa cada vacina... é segredo

Fica por saber se a solução agora encontrada irá servir o futuro. E, apesar da revelação de um segundo contrato [o primeiro publicado foi o firmado com a CureVac], diversas cláusulas e condições continuam na bruma.

Por exemplo, os cidadãos europeus não foram informados do preço real de cada dose da vacina, o qual varia conforme a farmacêutica. A maioria dos Estados-membros decidiu inocular gratuitamente a respetiva população, o que parece engavetar perguntas.

Nos contratos essa informação está oculta. A explicação da Comissão Europeia é simples. “Nesta fase, o preço específico por dose ainda está sujeito a obrigações de confidencialidade” conforme se lê na sua página de P&R sobre as vacinas

Outra possível controvérsia diz respeito a quem assume o pagamento de indemnizações às pessoas afetadas no caso de algo correr mal. 

Em ambos os contratos, com a AstraZeneca e com a CureVac, essa responsabilidade é assumida por cada Estado-membro, conforme se lê, respetivamente, no artigo 14.1 e no artigo 1.23.3., nos quais as farmacêuticas e “todos os seus afiliados” e subcontratados, numa longa lista, deverão ser “considerados isentos” de quaisquer reivindicações, incluindo “morte, lesões físicas, emocionais ou mentais, doença, incapacidade”, perda de bens e rendimentos ou custos legais.

Supõem-se que estas condições se repliquem noutros contratos como, por exemplo, com a Pfizer-Biontech. Só que, ninguém sabe. Poderão ser ainda mais favoráveis às farmacêuticas.

Indemnizações "inaceitáveis" às farmacêuticas

Algo que também se desconhece são as contrapartidas exigidas pelas farmacêuticasem caso de eventuais incumprimentos por parte da Comissão Europeia, de um Estado-membro ou outro Estado qualquer.

Há pelo menos dois casos no mundo que permitem levantar o véu sobre isso, ambos referidos pelo semanário argentino de esquerda, Brecha. 

Na Argentina, refere um artigo do Brecha publicado esta sexta-feira, o contrato com a Pfizer ficou bloqueado devido à questão das indemnizações, que os deputados argentinos queriam imputar à farmacêutica, condição que esta rejeitou.

Entretanto, referem os articulistas, Jorge Rachid, um médico assessor do Governador da província de Buenos Aires revelou a uma rádio que a Pfizer exigia condições "inaceitáveis" de garantias de pagamento, "com bens inatingíveis, incluindo petróleo e glaciares".

No Perú, já depois de ter garantido que qualquer controvérsia seria resolvida por arbitragem internacional, levando o executivo peruano a abdicar da sua imunidade soberana, a empresa norte-americana exigiu que o país, caso perdesse a disputa, a indemnizasse com ativos peruanos no exterior. 

Entre estes, bens móveis do serviço diplomático, aviões militares ou objetos de museu, afirma o Brecha. 

A multiplicação das doses e as seringas especiais

O mesmo artigo analisa em profundidade a relação entre o fornecimento das doses da Pfizer e as seringas usadas para as ministrar.

Nos Estados Unidos descobriu-se que cada frasco de vacina dava não para cinco doses, como inicialmente referido, mas sim, para seis. 

Em resultado, a farmacêutica pôde informar os serviços europeus que, a partir de 18 de janeiro, "cada bandeja enviada passaria a conter 1.170 doses e não as 975, com uma redução em 20 por cento do número de frascos", conforme noticiou o jornal espanhol El Mundo dia 25 de janeiro de 2021.Com essa alteração, a produção bruta da Pfizer prevista para este ano sobe de 1.300 a 2.000 milhões de doses, conforme comunicaram porta-vozes da empresa. Parece magia.

O problema é que a maioria das seringas não consegue extrair as tais seis doses. Apenas as chamadas de "baixo conteúdo morto" o conseguem fazer. 

Para se ter uma ideia, dos mais de 286 milhões de seringas que a empresa Becton Dickinson – o principal produtor de seringas do mundo – prometeu vender ao Governo dos Estados Unidos, somente 40 milhões são daquele tipo. São informações da própria empresa.

"Para a Pfizer, a aprovação por parte da FDA [a agência dos EUA que autoriza a comercialização de medicamentos] da dose extra, significa que pode cumprir o seu contrato e receber dos Estados Unidos o pagamento na totalidade com quase menos sete milhões de frascos", referiu dia 22 de janeiro ao The Washington Post, Sam Buffone, ex-assessor jurídico da divisão de fraudes civis do Departamento de Justiça.

"Contudo, muitas dessas sextas doses poderão acabar desperdiçadas porque os centros de vacinação não têm as ferramentas adequadas" para as extrair, sublinhou.

A sócia alemã da Pfizer, a Biontech, anunciou já este mês a produção e venda de 50 milhões de seringas especiais.

(RTP, Texto de Graça Andrade Ramos, 29.01.2021)

in rtp.pt

domingo, 31 de janeiro de 2021

Paul Verlaine - "Poète Maudit"

in discogs.com


Poeta maldito (em francês: poète maudit) é um termo utilizado para referir os poetas que mantêm um estilo de vida que pretende demarcar-se do resto da sociedade, considerada como meio alienante e que aprisiona os indivíduos nas suas normas e regras, excluindo-se mesmo dela ao adoptar hábitos considerados autodestrutivos, como o abuso de drogas. Sob este conceito está o mito de que o génio criador tem terreno especialmente fértil entre indivíduos mergulhados num ambiente de insanidade, crime, violência, miséria e melancolia, frequentemente resultando no suicídio ou outro género de morte prematura. A rejeição de regras manifesta-se também, geralmente, com a recusa em pertencer a qualquer ideologia instituída. A desobediência, enquanto conceito moral exemplificado no mito de Antígona é uma das características dos poetas malditos.

Os escritores do Romantismo utilizaram o termo, aplicando-o a François Villon (1431-c. 1474), considerado, por isso, como sendo o primeiro poeta maldito da história da literatura. O autor da expressão foi Alfred de Vigny, que a utilizou em 1832 na sua peça dramática Stello, onde se refere aos poetas como "la race toujours maudite par les puissants de la terre" ("a raça sempre maldita para os poderosos da terra").

O termo popularizou-se a partir da sua utilização para referir-se a um grupo de poetas, emprestado de uma série de artigos dos anos de 1884-1888 de Paul Verlaine intitulado "Les poètes maudits" (Os poetas reprovados), no "Boletim Lutèce", no qual poetas como Tristan Corbière, Rimbaud e Mallarmé eram enfatizados.

Charles BaudelairePaul VerlaineArthur Rimbaud e Lautréamont são considerados exemplos típicos.

O termo é relevante para as vanguardas do século XX, não apenas porque alguns dos seus precursores foram qualificados como malditos, mas porque estas, com sua postura polemista, iconoclasta, tendiam a sofrer grande resistência nos meios culturais.

Em diversas ocasiões na história, normalmente por razões políticas, grupos de poetas precisaram de se colocar à margem dos meios tradicionais de difusão de cultura, a fim de manterem viva a sua arte. ...(...)...
(in wikipedia.pt)


Le ciel est, par-dessus…

Le ciel est, par-dessus…

Le ciel est, par-dessus le toit,
Si bleu, si calme !
Un arbre, par-dessus le toit,
Berce sa palme.

La cloche, dans le ciel qu’on voit,
Doucement tinte.
Un oiseau sur l’arbre qu’on voit
Chante sa plainte.

Mon Dieu, mon Dieu, la vie est là,
Simple et tranquille.
Cette paisible rumeur-là
Vient de la ville.

– Qu’as-tu fait, ô toi que voilà
Pleurant sans cesse,
Dis, qu’as-tu fait, toi que voilà,
De ta jeunesse ?

Paul Verlaine, Sagesse (1881)


Paul Verlaine, "Poeta Maldito"

O valor da palavra na sua dimensão poética e musical assume em Paul Verlaine um estatuto da maior relevância.O preciosismo da sua escrita, que lhe permite através do artifício poético convocar ideias ou mesmo sensações, coloca-o numa plataforma privilegiada entre os seus pares simbolistas, Baudelaire, Rimbaud, Mallarmé.

Se o caráter inquieto do poeta contribuiu de forma indelével para a sua escrita, a conversão ao catolicismo, o alcoolismo, a relação tempestuosa com Rimbaud, os internamentos hospitalares e a passagem pela prisão fazem igualmente parte da sua agitada biografia.

À exceção dos «Poemas Saturninos» (1866), que não integram a Coleção Calouste Gulbenkian, podemos sinalizar no conjunto de obras aqui exposto alguns dos momentos-chave do percurso literário de Verlaine. Refira-se ainda que a intenção de Calouste Gulbenkian ao reunir estas obras não foi literária, mas sim o gosto pela raridade das edições e a qualidade das encadernações e das ilustrações. Assim, procurou-se nesta seleção o justo equilíbrio entre revelar a poesia de Verlaine e a sua materialização gráfica através da ilustração. A exceção refere-se ao poema «Le ciel est, par-dessus…», incluído na primeira edição de Sagesse (1881), que embora não ilustrado, convoca a musicalidade sempre presente na obra poética de Verlaine, que inspirou composições de Gabriel Fauré e de Déodat de Séverac.

(in gulbenkian.pt)


PAUL VERLAINE

Poeta francês nascido em 1844, em Metz, e falecido a 8 de janeiro de 1896, em Paris.
Paul Verlaine viveu até aos sete anos em Metz, cidade francesa onde o pai, capitão de Infantaria, estava colocado, mas depois mudou-se com a família para Paris. Estudou Direito, mas desistiu ao fim de dois anos, optando por prosseguir a formação no serviço civil, onde se graduou com 18 anos.
Fez amizade com vários poetas parnasianos e passava os seus dias em longas conversas enquanto bebia absinto. O pai, desgostoso com este estilo de vida, deixou de lhe dar dinheiro.
Verlaine já se dedicava à poesia e, em 1866, publicou o seu primeiro livro, les Poèmes Saturniens, que revela ainda a influência do Parnasianismo e de Baudelaire, seguido de Fêtes Galantes, três anos mais tarde.
Casou em 1870, mas, um ano mais tarde, apaixonou-se pelo poeta Arthur Rimbaud, na altura com 17 anos. Entretanto já havia escrito, para a sua mulher, La Bonne Chanson, onde revelou a sua esperança pela felicidade. Contudo, tinha um mau temperamento e chegou a bater violentamente na mulher e no filho.
O casamento durou pouco e Verlaine e Rimbaud optaram por levar uma vida boémia entre Londres, em Inglaterra, e Bruxelas, na Bélgica. No entanto, a 12 de julho de 1873, após uma discussão, tentou dar um tiro a Rimbaud e acabou por ser preso durante 18 meses. Na prisão, estudou Shakespeare e a obra Dom Quixote, de Cervantes, e escreveu Romances Sans Paroles, considerado pelos críticos uma das suas obras-primas. Escreveu também o poema Ars poétique (1874) - que só foi publicado dez anos mais tarde em Jadis et naguère, tendo sido posteriormente considerado como o manifesto do Simbolismo - em que amadurece a sua conceção de poesia, encarada essencialmente como "música", subjetividade, espontaneidade, sugestão.
Verlaine entretanto converteu-se ao Catolicismo e foi viver para Inglaterra, onde deu lições de Francês. Regressou ao seu país, em 1877, para dar aulas num colégio. Nesta altura, publicou Sagesse, onde a sua poesia estava repleta de sentimentos religiosos.
Em 1879, deixou o ensino e foi com um pupilo viver para o campo, para tentar dirigir uma quinta. No entanto, rapidamente foi à falência e regressou a Paris.
Com a morte do seu pupilo favorito, em 1883, e a perda da mãe, três anos mais tarde, Verlaine acabou por voltar a beber. Na altura, já era considerado o melhor poeta francês da época e tinha publicado uma obra controversa intitulada Les Poètes Maudits, composta por biografias de poetas, contos e versos sagrados e profanos.
Entrou numa fase de grande decadência, dormindo em bairros de lata e passando largos períodos hospitalizado. Juntamente com os poetas Stéphane Mallarmé e Charles Baudelaire, formou o grupo dos chamados "Decadentes", conhecido pela sua atração pelo mórbido, perverso e bizarro e pela liberdade moral.
Paul Verlaine gastou o dinheiro que lhe restava com duas prostitutas com quem vivia alternadamente e com um ladrão com quem mantinha uma relação homossexual.
Mesmo assim, em 1894, foi considerado "O Príncipe dos Poetas franceses" após a sua obra ter sido redescoberta pelos seus contemporâneos. Foi um dos líderes do Simbolismo, movimento que busca a espiritualidade e transcendência metafísica.
Morreu na miséria a 8 de janeiro de 1896, mas o seu funeral foi acompanhado por milhares de pessoas.

in: Paul Verlaine in Infopédia [em linha].  
Disponível na Internet: https://www.infopedia.pt/$paul-verlaine