DIANTE DE UMA CRIANÇA
Como fazer feliz meu filho?
Não há receitas para tal.
Todo o saber, todo o meu brilho
De vaidoso intelectual
vacila ante a interrogação
gravada em mim, impressa no ar.
Bola, bombons, patinação
Talvez bastem para encantar?
Imprevistas, fartas mesadas,
louvores, prémios, complacências,
milhões de coisas desejadas,
concedidas sem reticências?
Liberdade alheia a limites
perdão de erros, sem julgamento,
e dizer-lhe que estamos quites,
conforme a lei do esquecimento?
Submeter-se à sua vontade
sem ponderar, sem discutir?
Dar-lhe tudo aquilo que há
e entontecer um grão-vizir?
E se depois de tanto mimo
Que o atraia, ele se sente
Pobre, sem paz e sem arrimo,
Alma vazia, amargamente?
Não é feliz. Mas que fazer
para consolo desta criança?
Como em seu íntimo acender
uma fagulha de confiança?
Eis que acode meu coração
e oferece, como uma flor,
a doçura desta lição:
dar a meu filho meu amor.
Pois o amor resgata a pobreza,
vence o tédio, ilumina o dia
e instaura em nossa natureza
a imperecível alegria.
Carlos Drummond de Andrade
(Brasil, 1901- 1987)
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