sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

Os nossos hospitais e o caos nas urgências (II)

(continuação do post anterior)


"O que o Governo está a fazer para responder a este problema?

Pergunta 6 de 9
Antes do aparecimento das primeiras denúncias, ainda em dezembro do ano passado, o Ministério das Finanças tinha recusado a contratação de mais enfermeiros até ao final do ano. Na altura, a Ordem dos Enfermeiros condenou a recusa, sublinhando que a decisão podia comprometer a “segurança e a qualidade dos cuidados de saúde prestados”.
No fim de semana passado, em que surgiu a denúncia relativa a Faro, o primeiro-ministro anunciou a contratação de mais 200 enfermeiros para o SNS até ao final do mês de março, com o objetivo de reforçar a capacidade de resposta dos hospitais. De acordo com a Ordem dos Enfermeiros, esta contratação não vem a tempo, uma vez que já acontece depois do período crítico da gripe.
Questionado pelo Observador sobre se esta contratação acontece ao abrigo do plano de contingência para a gripe e sobre que medidas prevê tomar para responder a esta crise, bem como sobre qual o comentário que faz sobre as denúncias recentes, o Ministério da Saúde não respondeu até ao momento da publicação deste Explicador.

Escondem-se doentes quando o Governo visita os hospitais?

Pergunta 7 de 9
A acusação não é nova: funcionários de hospitais por todo o país têm denunciado que o “caos” é habitualmente “arrumado” quando membros do Governo visitam as unidades, mesmo que isso implique esconder doentes. Na segunda-feira, depois da divulgação da denúncia relativa a Faro, a bastonária da Ordem dos Enfermeiros, usou palavras mais duras. Numa entrevista ao jornal i, Ana Rita Cavaco disse que sempre que governantes “vão a uma urgência, escondem-se os doentes em qualquer sítio, até debaixo de escadas”.
“Tudo muda quando somos visitados pela comunicação social num mágico ‘empurrar de gente doente para baixo do tapete’ e em que parece tudo ser apenas ‘mais um pico de afluência’”, lia-se na denúncia tornada pública pelos enfermeiros de Faro. Também em Leiria, os enfermeiros se queixam do mesmo, numa denúncia publicada pelo Observador na terça-feira.
Na semana passada, o primeiro-ministro, António Costa, e o ministro da Saúde, Adalberto Campos Fernandes, visitaram vários hospitais do país e as imagens mostram unidades livres de qualquer tipo de caos ou confusão.
O presidente da Associação de Administradores Hospitalares, Alexandre Lourenço, recusou comentar as declarações da bastonária, sublinhando apenas que “essas acusações ficam com quem as afirma”. O Ministério da Saúde, questionado pelo Observador sobre o assunto, não respondeu até à publicação deste artigo.

Como tem evoluído o orçamento do SNS nos últimos anos?

Pergunta 8 de 9
Nos últimos três anos, a parte do Orçamento do Estado destinada ao Ministério da Saúde tem vindo a crescer. Contudo, isso nem sempre se verificou num aumento do orçamento para o Serviço Nacional de Saúde.
No Orçamento do Estado para 2016, o Governo transferiu para o Ministério da Saúde 9.479,7 milhões de euros, um aumento de 258,5 milhões relativamente ao ano anterior. Destes, 7.922,6 milhões foram para o SNS, um aumento de 45,1 milhões relativamente a 2015. Naquele ano, o Governo propunha-se a “revigorar e recuperar o desempenho do SNS, reforçando a equidade no acesso e a qualidade dos serviços prestados”.
Em 2017, o orçamento para o Ministério da Saúde tornou a crescer, com a atribuição de mais 353,3 milhões de euros. Deste aumento, perto de metade — 156,1 milhões — foram para o Serviço Nacional de Saúde. Entre as prioridades do Governo estavam o reforço dos cuidados de saúde primários — incluindo a contratação de mais médicos de família e a abertura de mais unidades de saúde familiar — e o alargamento da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados.
Agora, para 2018, o orçamento para o ministério subiu novamente — fixando-se nos 10.289,5 milhões de euros. Contudo, o orçamento destinado ao Serviço Nacional de Saúde caiu 0,6%, estando este ano estimado em 8.427 milhões de euros. Apesar disso, o Ministério da Saúde voltou a incluir nas prioridades o aumento das unidades de saúde familiares, o reforço da rede de cuidados continuados e também a redução dos tempos de espera nos hospitais.
No que diz respeito à contratação de profissionais, é de referir que todas as contratações dependem de autorização do Ministério das Finanças, o que para Alexandre Lourenço, presidente da Associação de Administradores Hospitalares, significa uma “redução da flexibilidade” dos hospitais para reforçar as equipas.
“A contratação até da pessoa menos diferenciada, que é alguém que até tem um salário reduzido, que é um assistente, carece de autorização do Ministério das Finanças. Pessoas que vão substituir outras por reforma, por doença, por licença de maternidade… precisamos de autorização em toda a cadeia”, explica Alexandre Lourenço.
Contudo, o responsável considera que “os hospitais portugueses têm mais recursos hoje do que há dois ou três anos”. Afirmação que contradiz aquilo que têm sido as denúncias dos enfermeiros em todo o país, que se queixam da crescente falta de recursos.

Existe um plano para responder a picos destes? O que diz?

Pergunta 9 de 9
Durante o pico da gripe, os hospitais do Serviço Nacional de Saúde implementam um plano de contingência para fazer frente ao natural aumento da afluência aos serviços de saúde. Idealmente, o plano passa por reforçar quer o número de camas disponíveis para internamento, quer as equipas dos serviços de urgência.
O aumento do número de camas pode resultar da abertura de serviços adicionais ou pela possibilidade de internar doentes em macas. No que toca ao reforço das equipas, este pode ser feito de duas formas: por um lado, deslocando profissionais de outros serviços, nomeadamente não desenvolvendo cirurgias ou consultas programadas para libertar esses profissionais para os serviços de urgência; por outro lado, através da contratação de mais profissionais.
“O que aconteceu este ano, contrariamente ao ano passado, em que foram admitidos enfermeiros ao abrigo do plano, é que este ano não foram autorizados”, diz a dirigente sindical, referindo que tal se deveu ao “atraso nas autorizações por parte do Ministério das Finanças”.
Entre outras medidas aplicadas ao abrigo destes planos, além do aumento do número de camas e do reforço das equipas, está a aplicação de horários alargados nos centros de saúde ou as consultas abertas nos hospitais.
Este ano, multiplicam-se as críticas à forma como o Ministério das Finanças está a gerir o financiamento destes planos de contingência. O bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, já veio dizer que “as autorizações chegam às pinguinhas”, que às vezes “só são autorizadas metade das camas e outras vezes são autorizadas sem pessoal”. Esta semana, as Finanças ainda não tinham autorizado a maioria das novas camas e novas contratações."

in: cmjornal.pt

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