Ao acompanhar todo este drama no nosso país em que a Covid 19 parece não querer desaparecer, senti um grito de revolta dentro de mim, e uma necessidade de dizer aquilo que Mafalda Anjos, Diretora da Revista Visão expõe no seu Editorial de 21.01.2021.
Será que posso dizer que faço minhas as suas palavras? Com a devida vénia, transcrevo o que a Diretora da VISÃO escreveu, partilhando aqui o seu pensamento, o seu sentimento, a sua opinião em relação à atuação do Governo sobre as nossas Escolas.
Escolas, trilemas e falhanços
Quando as escolas reabriram em setembro, foi anunciado que tudo estava pronto para se regressar ao ensino à distância ou a um regime misto se necessário. Foi dito que seriam colmatadas as necessidades das famílias desfavorecidas, esforço este que, digo eu, as empresas de telecomunicações deviam solidariamente comparticipar. E o que foi feito até agora? Se não foi feito o suficiente para se poder agora fazer este recuo, é grave. Como são preocupantes os sinais de algum desnorteio do Governo e de falta de capacidade de antecipação e resposta
Se um dilema é complicado de gerir, uma escolha difícil entre três opções – cada uma das quais, pelo menos à primeira vista – inaceitável, é ainda pior. É precisamente um trilema o que vivemos neste momento em Portugal. É impossível atender às necessidades da Saúde, do Ensino e da Economia sem colocar em causa algum destes valores essenciais. Em março, o Governo deu prioridade absoluta à Saúde, abalando drasticamente a Economia e o Ensino. Mas desde o verão que tenta manter em equilíbrio este trilema, sem o descentrar. Foi isso que pesou no regresso às escolas e na permissão de um Natal e Ano Novo mais folgados, apesar dos números altos de contágios. Facilitou, confiando – demais – na cidadania e no bom senso dos portugueses, que faltaram.
Chegados agora ao ponto em que nos encontramos, já não é possível equilibrar este trilema. Com uma média de dez mil novos contágios e a desoladora marca atingida dos 218 mortos num só dia, estamos numa condição alarmante. A situação sanitária atingiu um ponto de não retorno, com os hospitais no limite e os cuidados intensivos prestes a esgotarem.
As contas são claras. Sabemos que em Portugal, em média, por cada dia com dez mil novos casos, chegarão à unidades de cuidados intensivos (UCI) 150 pessoas dez dias mais tarde. Em dez dias nestes valores, 1 450 doentes terão necessidade de entrar nas UCI. É uma catástrofe anunciada que nos espera.
Isto estava à vista no dia 10, quando o Governo anunciou as novas medidas de confinamento, cheias de exceções. E estava claramente à vista na segunda-feira passada, quando as reforçou timidamente, perante o incumprimento generalizado. Este reforço, estabelecido num conselho de ministros extraordinário, foi um reconhecimento do falhanço da autoridade do Estado e das medidas inicialmente decretadas. Os moldes em que foi feito um novo e evitável falhanço. António Costa optou por manter o discurso e dar uns retoques cosméticos ao confinamento light decretado, não tocando no elefante na sala: as escolas abertas.
Este é um erro com consequências que vamos pagar caro. E ao fazê-lo, por claro compromisso ideológico, António Costa cometeu um fatal erro político. A ideologia e os valores têm muita força, mas há momentos em que a realidade tem ainda mais. Não fechar as escolas no momento certo, uma enorme comunidade que mexe com 2,5 milhões de pessoas, será para sempre apontado como a falha decisiva deste Governo na hora H. Todos os epidemiologistas de referência são claros: para travar a fundo a escalada de casos imparável é preciso encerrar os estabelecimentos de ensino, pelo menos a partir dos 13 anos. Há cada vez mais infetados dos 13 aos 24 anos, e a faixa etária dos 18 aos 24 tem sido, na segunda e terceira vagas, a que tem maior incidência. Ao invés de olhar a estes números e alertas dos especialistas, o Governo agarra-se a ideias feitas por comprovar: as de que os contágios não são feitos nas escolas. Nem isso é certo – não há quaisquer estudos que o comprovem e as crianças são, na sua esmagadora maioria, assintomáticas –, nem isso nesta fase é o determinante. Mesmo que o problema original nesta escalada da Covid-19 não esteja nas escolas, travá-la implica agora reduzir ao máximo todos os contactos. Um estudo publicado na Science em dezembro determinou que, só por si, o fecho das escolas e universidades reduz o Rt em 38 por cento.
Fechar as escolas, ou parte delas, é uma medida odiosa. Ninguém duvida de que põe em causa a justiça social e afeta sobretudo os mais desfavorecidos, e é por isso que todos os países o quiseram evitar. Sabemos que há muitos miúdos que só comem uma refeição decente por dia nas escolas. Sabemos que boa parte do País não tem computadores nem internet em casa. Mas há formas de contornar isso. Estamos a falar de um mês, e não de um trimestre inteiro. O calendário escolar pode ser alterado, fechando agora e abrindo nas férias da Páscoa. E as escolas podem manter-se abertas para atender às situações mais carenciadas e para assistência alimentar.
Há também um ponto fundamental: quando as escolas reabriram em setembro, foi anunciado que tudo estava pronto para se regressar ao ensino à distância ou a um regime misto se necessário. Foi dito que seriam colmatadas as necessidades das famílias desfavorecidas, esforço este que, digo eu, as empresas de telecomunicações deviam solidariamente comparticipar. E o que foi feito até agora? Se não foi feito o suficiente para se poder agora fazer este recuo, é grave. Como são preocupantes os sinais de algum desnorteio do Governo e de falta de capacidade de antecipação e resposta. O cansaço e a saturação são gerais, mas, mais do que nunca, temos de nos recentrar e atacar o problema com determinação. Isto não vai lá de outra forma.
(in VISAO.SAPO.PT 21.01.2021)
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