Gabriela Ruivo Trindade vence Prémio Leya com um romance que junta ficção e fotografia
O romance Uma Outra Voz, escrito por uma portuguesa 
radicada em Londres, ganhou o Prémio Leya. Retrata a emigração para 
África de uma família de Estremoz.
                    Manuel Alegre, presidente do júri, depois de aberto o
 envelope onde está escrito o nome do concorrente, comunicou por 
telefone a Gabriela Trindade a notícia de que era vencedora do Prémio 
Leya. Nessa altura ficou a saber que ela nunca tinha escrito um romance e
 também nunca tinha publicado. “É um romance onde se cruzam histórias 
individuais com a história colectiva. É um romance onde se cruzam várias
 personagens e é também a história de uma cidade do Alentejo, Estremoz”,
 disse ao PÚBLICO o escritor.
“Tem personagens femininas muito 
fortes, isso foi uma das coisas que mais me marcou e uma história de 
amor também muito forte”, acrescentou. E tem ainda “traços de 
originalidade e modernidade”, como o facto de mostrar algumas 
fotografias de um personagem que a certa altura vai para África, são 
fotografias dos anos 30, numa fazenda de café. “Foi uma boa escolha. 
Vê-se que num período de crise destes as pessoas estão a procurar 
soluções pela criatividade e neste caso pela criatividade literária.”
A
 obra vencedora, anunciada esta terça-feira de manhã, foi escolhida por 
um júri que incluiu também os escritores Nuno Júdice, Pepetela e José 
Castello, e ainda José Carlos Seabra Pereira, da Universidade de 
Coimbra, Lourenço do Rosário, reitor do Instituto Superior Politécnico e
 Universitário de Maputo, e Rita Chaves, da Universidade de São Paulo.
O
 poeta Nuno Júdice disse que destacaria em primeiro lugar “a qualidade 
da escrita” na obra da premiada. “A coerência com que a história de uma 
família de Estremoz é narrada desde o século XIX até este século sem 
seguir o cânone do romance realista do século XIX.”  Retrata a 
realidade, pouco conhecida, da emigração para África muito antes da 
guerra colonial. "É uma visão muito inovadora da nossa história com 
pouco mais de um século."
Com cerca de 300 páginas, é um romance 
contado a várias vozes, com personagens femininas muito fortes, em que o
 ponto de vista da história se vai alterando. Júdice, tal como 
Alegre, explicou que não se trata de uma narração simples, mas de um 
romance em que por vezes encontramos documentos visuais que nos permitem
 ver melhor o que foi essa época: “Junta fotografia com ficção.”
A
 força do livro está para o crítico literário brasileiro José Castello, 
que também fez parte do júri, “na insatisfação” que gera a escrita de 
Gabriela Ruivo Trindade. “É uma escrita polifónica. Uma escrita que 
mistura fotografia, árvore genealógica, é uma escrita inquieta”, disse 
Castello ao PÚBLICO. “Muitas vezes existem livros bem narrados, bem 
organizados mas escritos com medo. Escritos dentro de modelos clássicos,
 repetitivos. E esse livro, mal você começa a ler, começa a descobrir 
que está entrando num terreno que nunca pisou."
Para o 
crítico, "essa aposta numa escrita muito original, num olhar original 
sobre o mundo parece[-lhe] que foi o motivo mais forte para premiar esse
 livro”. O romance tem “um entrelaçamento de histórias”, mas “o 
principal são as vozes”. “Você nunca sabe direito os limites de fantasia
 e de realidade. É um livro muito interessante, só lendo mesmo para 
poder entender”, acrescentou.
Segundo o grupo Leya, esta foi, até 
agora, a edição “mais concorrida e internacional” do prémio, com 491 
originais oriundos de 14 países. Instituído em 2008 com o objectivo de 
distinguir anualmente um romance inédito escrito em língua portuguesa, o
 prémio foi nesse ano atribuído ao livro O Rastro do Jaguar, do
 jornalista e ficcionista brasileiro Murilo Carvalho. No ano seguinte 
venceu o escritor e historiador moçambicano João Paulo Borges Coelho, 
com o romance O Olho de Hertzog, e em 2010 o júri, também então
 presidido por Manuel Alegre, decidiu não atribuir o prémio, entendendo 
que nenhum dos originais recebidos tinha qualidade para o receber.
Nos últimos dois anos, o Prémio Leya ficou em Portugal: em 2011 recebeu-o João Ricardo Pedro, com O Teu Rosto Será o Último, e ano passado foi a vez de Nuno Camarneiro, com o romance Debaixo de Algum Céu.http://www.publico.pt/cultura/noticia/gabriela-ruivo-trindade-vence-premio-leya-1609157
 
 
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