quarta-feira, 28 de outubro de 2015

Como vai a esquerda portuguesa viabilizar um governo?

in: observador.pt
Um artigo muito importante, tocando pontos sensíveis da nossa política portuguesa e que serve para nos ajudar a compreender a situação complicada  atual:

"Como pagar um acordo? 

Onde a esquerda pode ir buscar dinheiro para aliviar a austeridade

O PS negoceia sem pressas com o PCP e Bloco, fazendo contas às propostas que podem viabilizar um governo de esquerda. O programa de Centeno tinha ideias para compensar desvios. Quais sobram?
Autores: Nuno André Martins e Miguel Santos
Congelamento de pensões, limites nas prestações sociais 
não contributivas ou impostos sobre as heranças. 
Numa altura em que se fala dos aumentos de despesa 
ou de perda de receita de um eventual acordo 
entre o PS e a esquerda, 
que ideias podem os negociadores 
ir buscar ao programa do PS para compensar 
eventuais desvios nas contas públicas?
Tendo em conta as condições impostas pelo PCP e BE 
para viabilizar o governo de António Costa, 
as contas não serão fáceis de fazer – 
sobretudo tendo em conta que o primeiro Orçamento 
está mesmo à porta e que em cima da mesa estão 
várias medidas que envolvem aumento 
da despesa do Estado ou perda de receita. 
Sem sabermos ainda quanto poderão custar 
as medidas, é possível pelo menos recuperar, 
no documento macroeconómico do PS, 
algumas medidas de compensação que podem 
ajudar agora a compor as novas contas – 
pelo menos parcialmente, visto que PCP e BE 
também podem travar algumas dessas propostas 
(já lá vamos).
As medidas foram incluídas no documento do PS 
em várias secções, com o objetivo de avançar como 
compensação apenas caso um conjunto de medidas 
específico para aquele setor também avançasse. 
Vejamos quais eram, uma a uma, e quais devem 
ficar pelo caminho. No que diz respeito ao capítulo 
dos rendimentos, em cinco medidas apenas uma 
previa uma poupança para os cofres do Estado, 
aplicação da condição de recursos nas prestações 
sociais não contributivas
Entre 2016 e 2019, esta medida deveria gerar 
uma poupança de 1.020 milhões de euros 
(pouco mais de 250 milhões/ano). 
Mas a medida foi muito criticada pelo Bloco 
na campanha, pelo que dificilmente um acordo 
passará por aqui; 
O congelamento das pensões – 
com exceção das mínimas 
(poupança estimada de 1.660 milhões de euros). 
Mais um ponto que não passará nas negociações, 
pelo menos não como propunha o PS: 
Catarina Martins fez-lhe ataque cerrado no debate 
com Costa e o PS aceitou reabrir o dossiê que valia 
415 milhões/ano na proposta do PS. 
De resto, havendo descongelamento de pensões, 
o novo Governo terá que inscrever a despesa no 
próximo orçamento;
Substituição dos atuais incentivos à contratação 
pela redução da TSU (o que se poupa aqui, 763 
milhões, gastar-se-ia com a perda de receita 
na TSU). 
A verdade é que a redução da TSU não avança, 
por imposição do Bloco, mas nada impede que 
fiquem estas penalizações, que podem garantir 
à volta de 190 milhões de euros/ano
Na parte que dizia respeito ao estímulo ao emprego, 
onde se incluía a redução da Taxa Social Única (TSU) 
paga pelos empregadores como pedra chave 
e para a qual as outras serviam de compensação, 
o PS propunha medidas como a penalização da rotação 
excessiva de trabalhadores numa empresa aumentando 
a contribuição para a Segurança Social 
(250 milhões de euros/ano, até 2019). 
Neste caso, não há obstáculos à esquerda do PS; 
O programa socialista também propunha um imposto 
sucessório para heranças superiores a um milhão de euros 
(receita de 280 milhões de euros em 4 anos, 70 milhões/ano)
 – que está também nos programas dos futuros parceiros; 
(O PS propunha também consignar 4 pontos percentuais 
da receita de IRC à Segurança Social, mas parte desta 
seria feita evitando a redução prevista da taxa de IRC, 
por isso as contas não são de uma receita extra face 
ao cenário atual). 
Na despesa do Estado, o PS propunha também poupar 
mais 1.810 milhões de euros durante a legislatura 
(452 milhões/ano, em média) com poupanças 
na contratação de serviços externos, racionalização e 
simplificação de serviços públicos e reorganização de 
serviços desconcentrados. Tudo isto desde 2016 até 2019, 
de forma acumulada. Esta poupança é, mesmo assim, 
mais dificilmente atingível – e só em pleno mais à frente 
na legislatura, visto que se tratam de cortes 
que demoram tempo a implementar.
Feitas as contas às principais medidas, o PS conseguirá 
aqui ir buscar, num cenário otimista, menos de 1.000 
milhões de euros no próximo ano, para compensar 
as cedências de que precisa para chegar a acordo 
com PCP e Bloco. Se os termos do acordo incluírem 
as medidas conhecidas, estes valores podem servir 
para compensar devolução de salários, 
descongelamento de pensões e pouco mais.
Ora, as negociações com Bloco e PCP incluem 
mais matérias com custos diretos potenciais, 
como a descida do IVA da restauração ou da eletricidade. 
E o PS terá ainda de contar com o esforço adicional 
exigido pela Comissão Europeia para manter a trajetória 
de redução do défice, mesmo que pela margem mínima 
exigida pelo Tratado Orçamental. 
Além dos outros problemas de caminho
como o pagamento eventual do crédito fiscal 
de IRS, concedido pelo atual Governo."





in observador.pt




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