Desde sempre, ouvíamos os mais velhos dizerem que agouro era um presságio baseado na observação de factos ou objetos, uma profecia, um sinal de uma coisa negativa.
Quem não se lembra, em pequeno, de ouvir o pai ou a mãe dizer em casa: "Meninos, não se põe o chapéu ou o guarda-chuva em cima da cama, que dá azar!". Se o meu pai por acaso via facas cruzadas na mesa, dizia logo para as descruzar porque era sinal de que podia acontecer algo de mau.
Também era hábito lá em casa ouvir dizer entre nós, quando queríamos livrar-nos de algo, repelindo o que não queríamos que nos acontecesse: "bate lá três vezes na madeira" (=o diabo seja cego, surdo e mudo; ou então, =lagarto, lagarto, lagarto= cruzes canhoto).
E, tal como estes exemplos, há outros, são inúmeros!
Uma superstição que eu ouvia muito a minha mãe era a de não deixar limpar teias de aranha onde as houvesse alojadas, pois para ela, aranhas, aranhiços e aranhões eram sinónimo de "dinheiro"! Deviam ser conservadas, era bom sinal, era dinheiro que vinha aí, e este faz sempre falta numa casa de família, por isso era bem-vindo! Assim como quando caía açúcar na toalha era sinal de sorte ou boa fortuna. Ainda um exemplo de que me lembro, dum copo que se partia, dizia-se logo que era sinal de que alguém tinha inveja de nós, mas se bebêssemos do mesmo copo de um amigo ou amiga, ficávamos a conhecer os seus segredos......
Outra superstição frequente ainda nos dias de hoje: se se oferecer lenços a uma pessoa, esta deve entregar em troca uma ou duas moedas. Na altura, quando eu era miúda, se me ofereciam meia dúzia de lenços, eu retribuía aí com uns 5 escudos; hoje, talvez convenha retribuir com 50 cêntimos..; de contrário, pode acontecer algo de mal...nunca se sabe...!
No meu imaginário há muitos exemplos, sei que fazem parte dos saberes populares, mas é bom recordá-los e sobretudo pensar que ainda hoje muita gente continua a acreditar em pragas, agouros, rezas, superstições...uns são positivos, outros são negativos...
Partilho aqui algumas explicações para alguns presságios e que encontrei na leitura de um livro que aconselho:
in fnac.pt |
Agouro ou presságio é sempre um prognóstico, um vaticínio. Em tempos bem antigos, era a predição feita pelos áugures, os sacerdotes romanos. Esse vaticínio tinha por base a observação do voo e canto das aves. Hoje, um agouro ou presságio é sempre uma predição a respeito do futuro, um indício de um acontecimento nefasto, pode até ser apenas de uma má notícia. Um sinal que prenuncia algo.
Na literatura portuguesa, de imediato, lembramo-nos de Frei Luís de Sousa, de Almeida Garrett. Madalena fica intimidada com os agouros de Telmo: "..." não entremos com os teus agouros e profecias do costume: são sempre de aterrar (...) deixemo-nos de futuros (...); mas as tuas palavras misteriosas, as tuas alusões frequentes (...) esses teus contínuos agouros em que andas sempre, de uma desgraça que está iminente sobre a nossa família (...)." Estes temores de Telmo dão força aos de Madalena e indiciam a destruição de toda a sua família, um destino irrevogável. São imensas as referências ao "dia fatal", à "hora fatal", o retrato do Manuel de Sousa a arder, o medo de sexta-feira, e, claro, como não podia deixar de ser, o célebre "Ninguém" do Romeiro.
Também em "Os Maias", de Eça de Queiroz, o tema é recorrente. Quem não se lembra da lenda recordada por Vilaça, segundo a qual "eram sempre fatais aos Maias as paredes do Ramalhete", de Afonso ao se aperceber da semelhança entre o filho Pedro e o avô da sua mulher, que enlouquecera e se enforcara, a sombrinha de Maria Monforte, quando Afonso a vê pela primeira vez: "como uma larga mancha de sangue alastrando a caleche sob o verde triste das ramas".
Por outro lado, Fernando Pessoa, num poema intitulado precisamente "Presságio", julga que o amor apenas é verdadeiro quando não passa de um presságio, existindo apenas no seu interior:
"O amor quando se revela/Não se sabe revelar/Sabe bem olhar p'ra ela/Mas não lhe sabe falar
Quem quer dizer o que sente/Não sabe o que há-de dizer/Fala: parece que mente/Cala:parece esquecer
Ah, mas se ela adivinhasse/Se pudesse ouvir o olhar/E se um olhar lhe bastasse/P'ra saber que a estão a amar!
Mas quem sente muito, cala/Quem quer dizer quanto sente/Fica sem alma nem fala/Fica só, inteiramente/
Mas se isto puder contar-lhe/O que não lhe ouso contar/Já não terei que falar-lhe/Porque lhe estou a falar"
A verdade é que, desde sempre, a humanidade procurou interpretar os sinais à sua volta. Os seus significados foram sendo estabelecidos de acordo com um certo padrão de frequência. Observava-se x e, se acontecia y, então atribuía-se a x um determinado significado. O povo encarregou-se de transmitir esses conhecimentos, todo esse saber, passando-o de geração em geração.
Como é óbvio, bons agouros indiciam algo de positivo, enquanto os maus pressagiam acontecimentos ou momentos desastrosos, até mesmo fatais.
(in Livro das PRAGAS, Agouros, Rezas, Superstições e outros Esconjuros", Guerra & Paz Editores, S.A. 1ª edição, março 2019)
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