quinta-feira, 15 de setembro de 2022

Homenagem a Bocage: parabéns, Setúbal, por este grande poeta aí nascido a 15 de setembro!

Bocage: libertinagem em bom português - Domingo - Correio da Manhã
imagem in cmjornal.pt

Bocage

Poeta português

Biografia de Bocage

Por Dilva Frazão  Biblioteconomista e professora 
(in ebiografia.com)

Bocage (1765-1805) foi um importante poeta português do século XVIII, considerado o maior representante do Arcadismo e o precursor do Romantismo. Poeta satírico, erótico e pornográfico, é vítima até hoje de sua própria fama e dos preconceitos que despertou.

Manuel Maria Barbosa du Bocage nasceu em Setúbal, às margens do rio Sado, em Portugal, no dia 15 de setembro de 1765. Filho de José Luís Soares de Barbosa, juiz de fora e ouvidor, e de Mariana Joaquina Xavier l'Hedois Lustoff du Bocage, descendente de família da Normandia, região histórica do noroeste da França.

Em 1783 Bocage alistou-se na Marinha de Guerra, embarcando para a Índia três anos depois, onde foi promovido a tenente e mandado para Damão, desertando logo depois.

Ao fugir da Marinha, viveu em Macau e de lá retornou ao seu país em 1790. No regresso à Lisboa, apaixonou-se pela mulher do seu irmão e entregou-se à boémia. Nessa época, escreveu versos sobre a desilusão amorosa e as dificuldades financeiras.

Bocage e o Arcadismo

Considerado como o grande poeta do Arcadismo de Portugal, apesar de ter deixado fama de poeta satírico, Bocage é um dos maiores poetas líricos da literatura portuguesa.

Com o pseudônimo de Elmano Sadino, participou da associação de poetas denominada “Nova Arcádia” ou Academia das Belas-Artes, que surgiu em Portugal em 1790, escrevendo poesias que falam de pastores, ovelhas e da mitologia clássica.

O próprio nome do movimento faz referência à Arcádia, região da Grécia onde, segundo a mitologia, pastores e pastoras levavam uma vida inocente e feliz, em contato com a natureza. 

A academia publicou algumas poesias sob o título de Almanaque das Musas e teve curta duração, conquistando prestígio somente com a produção de Bocage e de José Agostinho de Macedo. Indispondo-se com o mesmo, ao satirizar os confrades, afastou-se da academia.

Carta a Marília

Em 1797, sobretudo devido ao poema Carta a Marília, cujo verso inicial é “Pavorosa Ilusão de Eternidade”, Bocage recebe ordem de prisão.

Acusado de impiedade e antimonarquismo foi condenado e passou meses na masmorra do Limoeiro, nas da Inquisição, no claustro de São Bento e no convento dos oratorianos, até se conformar com as convenções religiosas e morais da época e se retratar.

Ao voltar à liberdade, Bocage levou uma vida dedicada à tradução de autores latinos e franceses.

Trecho do poema Carta a Marília:

Pavorosa Ilusão de Eternidade,
Terror dos vivos, cárcere dos mortos;
D’almas vãs sonhos vão, chamado inferno;
Sistema de política opressora,
Freio que a mão dos déspotas, dos bonzos
Forjou para a boçal credulidade;
Dogma funesto, que o remorso arraigas
Nos termos corações, e a paz lhe arrancas:
Dogma funesto, detestável crença,
Que envenena delícias inocentes! (...)

Poeta Lírico

Bocage deixou fama de poeta satírico e, com o tempo seu nome tornou-se sinônimo de contador de histórias picantes e obscenas. Por outro lado, Bocage produziu também os mais belos poemas líricos, a ponto de ser colocado ao lado de Camões e Antero de Quental, como figuras máximas da poesia portuguesa.


Retrato do poeta Bocage


Retrato do poeta Bocage

Ao lado da sátira agressiva, Bocage desenvolveu sua veia amorosa, retratando os seus dramas existenciais numa linguagem emotiva que encontrou grande receptividade entre os leitores daquela época e dos séculos seguintes, tornando-se  o poeta mais lido em Portugal. O ciúme é a tónica de muitos versos, refletindo a sua insegurança em relação ao objeto amado.

Bocage foi pré-romântico no gosto do mórbido, no uso de palavras altissonantes, nos recursos a interjeições, reticências e apóstrofes. Sua poesia individualista e pessoal foi uma antecipação do que seria a poesia romântica do século XIX.

Além de sonetos, Bocage compôs elegias, odes, fábulas e cantatas. Escreveu, também epigramas e sessenta e nove sonetos satíricos, onde a caricatura é a marca fundamental. As melhores composições são: Pavorosa Ilusão da Eternidade e Pena de Talião, dirigida a seu inimigo José Agostinho de Macedo.

Publicou em vida apenas Rimas, (1791-1804) em III volumes. Na edição de VI volumes de 1853, intitulada Poesias, estão as melhores coletâneas de sua obra, como também as traduções de Ovídio e Jacques Delille.

A preocupação com a métrica, com a estruturação do poema e a seleção vocabular colocam os sonetos de Bocage como verdadeiras obras-primas, como no trecho da seguir: 

Convite a Marília:

Já se afastou de nós o inverno agreste
Envolto nos seus húmidos vapores;
A fértil Primavera, a mãe das flores,
O prado ameno de boninas vestes:

Varrendo os ares o subtil nordeste
Os toma azuis; as aves de mil cores,
Adejam entre Zéfiros, e Amores,
E toma o fresco Tejo a cor celeste:

Vem, ó Marília, em lograr comigo,
Destes alegres campos a beleza,
Destas copadas árvores o abrigo:

Deixa louvar da corte a vã grandeza:
Quanto me agrada mais estar contigo
Notando as perfeições da Natureza!

Sem comentários: